segunda-feira, 4 de abril de 2011

A missão da Igreja no século XXI


“Como o Pai me enviou, eu também vos envio.” (Jo 20.21b)
Se a igreja não é missionária no dia a dia, na totalidade da sua presença no mundo, ela deixa de ser igreja para tornar-se uma associação, um clubinho de auto-ajuda.

Compreender que cada membro deve capacitar-se para que o Espírito Santo o use dando-lhe oportunidades maiores para esta ação, que não seja sempre o mesmo leitinho, que Paulo já advertia no passado, mas que seja uma constante busca pelas novidades do Criador.

Este tema faz jus somente aos cristãos verdadeiros e só assim faz sentido. Mesmo que um não convertido que freqüente a igreja pense no seu direito de fazer missões, ele não consegue exercê-la, já que “a missão é de Deus e, portanto, tudo o que a igreja pode fazer é se unir a Deus na missão que já está acontecendo para a redenção da criação.” (González, 2009, p. 212). Não faz sentido exigirmos isto de alguém, isto é algo que deve fazer parte da consciência do cristão através de certa instrução e o Espírito manifestará na vida dos seus esta necessidade.


Missão integral no nascimento da igreja

Atos 2. 1-13

Quando pensamos em missão automaticamente vem a nossa mente aquele missionário na África e a igreja daqui o sustentando. Porém, o que este texto em Atos expressa, este trecho do nascimento da igreja, ele deixa claro o principal ato dela já sendo executado no exato momento do seu nascimento, que é a missão, quando o Espírito veio sobre aquelas pessoas, das 120 ali, não foram 5 ou 10 que saíram a proclamar as maravilhas de Deus, mas todas!

O fato principal desta passagem sempre foi deixado de lado em nome de uma errônea validação do dom de línguas como evidencia do batismo com o Espírito Santo. Porém, está claro que neste momento do nascimento da igreja ninguém falou em línguas estranhas, sendo este um dom sistematizado por Paulo nas cartas, mas que no nascimento da igreja não ocorre. O que ocorre é o evangelismo, a comunicação a todos das maravilhas de Deus, aqui habita o sentido máximo da nossa característica cristã, o falar, comunicar de forma entendível, de forma clara as maravilhas de se ser cristão, de ter o Espírito de Cristo em nós.

E como se dá esta comunicação clara? Desta forma que nós como cristãos nos apresentamos na rua? Fazendo separação, andando aparentemente com um tipo de roupa? Um tipo de penteado? Um tipo de palavreado? Abarrotado de palavras arcaicas tiradas de uma cultura não pertencente a nós?

(ler novamente Atos 2. 8-11)

O fato que devemos atribuir valor e grande glória a Deus é pela comunicação aqui ocorrida e não pelo ato extraordinário de se falar uma língua que não se sabia previamente.

Esta passagem deve ser o impulso histórico da igreja em todas as suas fases. É nossa responsabilidade compreende-la em nosso contexto de época, de cultura e de território.

O pensamento da igreja em missões não deve ser o de sustentar um missionário em terra distante, mas pensar cada membro como um missionário integral. No bairro, no ponto de ônibus, na panificadora, na escola, no trabalho.

Não pense agora, porém, que basta comprar um bloco de folheto e distribuir pela cidade. O missionário integral tem a sua vida como aparelho comunicativo do seu estado de Igreja, e um aparelho comunicativo deve conhecer-se inserido no contexto temporal em que atua; do contrário a comunicação do evangelho falha.

Ficou cada vez mais claro que o contexto social e econômico do teólogo imprimi seu selo sobre a teologia de cada um. Surgiu assim toda uma série de teologias que, em lugar de negar seu caráter contextual o afirmam, declarando que isso provê com perspectivas novas e valiosas quanto ao sentido das Escrituras, do evangelho, e das doutrinas em geral. (González, 2009, p. 72)

E se vermos desta forma “toda teologia é necessariamente contextual, e aquela que pretende ser universal e livre de seu contexto, simplesmente é uma teologia preconceituosa.” (González, 2009, p. 72) pois como podemos afirmar sem conhecimento de causa da cultura oriental ou africana se nunca saímos da nossa cidade no interior do Brasil?


Comunicação como instrumento eficaz

Augustinho diz que existem duas coisas necessárias ao tratamento das Escrituras: uma maneira de descobrir (modus inveniendi) aquelas coisas que se devem compreender e uma maneira de expressar aos outros (modus proferiendi) aquilo que aprendemos. (Hesselgrave, 1994, p. 29)

O primeiro passo que dará sucesso à proclamação do evangelho é o conhecer e entender aquele a quem estão passando estas informações, e isto só é possível se colocando no lugar destes, sentindo suas dores e alegrias, inserir-se no contexto do outro para que o evangelho de Jesus faça sentido no momento da proclamação.

O grande aspecto da torre de Babel foi a perda de comunicação dos seres humanos que só se restituiu com a igreja em Atos 2. Porém, devemos estar conscientes espiritualmente para aprendermos que estas comunicações hoje ultrapassam a linguagem somente, mas que ela toda é composta de signos (símbolos) que dependem de interpretação.

Aristóteles desenvolveu a base do que ainda hoje podemos falar dos processos de comunicação, para ele haviam três pontos de referencia: o orador, o discurso e o ouvinte. Entre estes existem um processo de codificação e decodificação.

O emissor (que é o orador de Aristóteles) possui um código dentro dele, que exteriorizado torna-se mensagem. Então a comunicação deve ser voltada para a recepção e ajustada aos diferentes públicos, o que a Bíblia deixa claro nos exemplos apostólicos, principalmente de Paulo.

Portanto, o emissor deve analisar o receptor em termos antropológicos, sociológicos e psicológicos. Quanto mais pudermos saber sobre o receptor, mais sucesso teremos, já que poderemos usar as informações para moldar a mensagem do evangelho ao contexto do outro.

A palavra “comunicação” vem do latim COMMUNIS (comum). Devemos estabelecer uma “comunhão” com alguém para haver comunicação. A “comunhão” encontra-se em códigos partilhados mutuamente (Hesselgrave, 1994, p. 39)

Por isso a decodificação do receptor, jamais é plena da mensagem do emissor, sendo que ambas possuem uma distância muito longa de coisas em comum, mas o quanto mais claros pudermos ser e mais próximos da realidade do outro, mais chances haverão do evangelho fazer sentido, sendo que ele como mensagem é símbolo e símbolo fora de contexto não possui sentido. Devemos aproximar o código do receptor a tal ponto dele decodificar sem que sejam abstrações sem paralelismo fundamentalmente evangélicos.

Já que “somos observadores imperfeitos ou porque interpretamos erroneamente o modo como o mundo é de fato” (Hesselgrave, 1994, p. 51) é que nossas igrejas não estão alcançando aqueles que deveriam.

Pensamos que o “nós como instrumentos de Deus para a evangelização” é baseado em horas de oração. Isso nunca foi realidade, já que aí transferimos a responsabilidade para nós como se o poder de conversão do outro estivesse no instrumento e não no Senhor; mas a capacitação do cristão como comunicador é um louvor a Deus como se dissesse: “estou pronto para o Senhor me usar com aqueles que o Senhor deseja alcançar e colocar no meu caminho”, pois também tem a ver com humanidade, humildade e amor, o colocar-se no lugar do outro e o aprender sobre o outro contexto gera respeito, o que em muitos casos as excessivas horas de oração fazem o contrario, pois os ascetas não tendo contato com os “pecadores” acabam tornado-se soberbos.

Este é o principal motivo do pouco sucesso de muitos missionários mundo afora, e não por ser uma “luta com o inimigo”, mas por estes terem pouco conhecimento das diferenças lingüísticas, políticas, econômicas, sociais, psicológicas, religiosas, nacionais, racionais, entre outras.

O bom missionário é aquele que se insere por completo na sua proposta missional.

A igreja nasce, mantém-se e transforma-se pela missão de Deus. Ao mesmo tempo, ela também é sujeito ativo nessa missão. Isso é, a igreja discerne e descobre a atividade de Deus no mundo e dela participa. (González, 2008, p. 23)


Missão da Igreja na Teologia do Cotidiano

A Igreja é a representação e a explanação de Deus no mundo, ela é o conhecimento do Divino no mundo material e natural como também a imagem da Religião em meio a aqueles que precisam da regeneração.

Mas não da forma que automaticamente nos vem a mente, daqueles belos prédios e catedrais no meio das cidades, ou de grupos que se reúnem e cultuam a Deus, este testemunho não é a plenitude do conhecimento da sabedoria de Deus através da Igreja na sociedade (Ef 3.10), mas apenas a mínima parcela da sua capacidade e propósito.

A unidade da Igreja, também não é esta que se apresenta em grupos que se reúnem para propósitos eclesiásticos, evangelísticos, de estudo ou outros, mas da ligação espiritual e amorosa que se identifica no natural, são os irmãos que mesmo sem conhecimento prévio, mesmo afastados geograficamente, falam uma só língua e pronunciam uma só mensagem.

O regenerado não é aquele que abraça a fé cristã unicamente, ou que se “converte” ao cristianismo, o que se batiza em alguma instituição, ou abandona os vícios e muda suas velhas práticas, pois tudo isso pode ser meramente impelido pelo externo e estar sujeito a novas mudanças quando algum evento assolar o ser, ou até mesmo se ele eventualmente continuar até o fim da vida dedicando-se a esta fé, mas por implicações externas e manter-se ali por comodismo ou inúmeras outras possibilidades de fatores, ainda assim este não será um regenerado.

A Igreja em sua missão só terá sucesso ou fará sentido se os seus indivíduos regenerados viverem de forma igualitária dentro do propósito de Deus para cada membro do seu Corpo, no meio da sociedade, mesclando-se a ela e partilhando de tudo que permita a proximidade e a experiência no mesmo grau que os não regenerados, para através da sua vida ser exemplo vivo, claro, evidente e palpável daquele que tem o Espírito de Deus o guiando, em oposto a aquele que não O têm. Só assim a Igreja falará à aqueles que se encontram fora de Cristo, se a Igreja for e viver onde os pecadores vão e vivem, seguindo o exemplo do que Jesus fez.

O que se vê é que pessoas se convertem ao cristianismo e se enclausuram dentro de quatro paredes e saem visitar as pessoas apenas para distribuir folhetos e falar versículos bíblicos, e isto não é missão da Igreja e isto não surte efeito (com exceção de casos específicos, mas não por méritos do objeto, mas por escolha do Espírito Santo).

A instituição religiosa faz um desserviço a missão integral, ao fabricar uma cultura segmentada “gospel”, ela pretende converter as pessoas a esta cultura, que é em geral uma cópia pobre das culturas gerais e contrárias a reflexão existencial, religiosa e social.

Se o evangelho não for compreendido e praticado em sua essência por aqueles que realmente são Igreja, e os mesmo se deixarem sucumbir pela pressão exercida pela instituição e tudo que vem atrelado a sua prática limitadora e prisional, a Igreja verdadeira será engolida por um sistema que tenta transpor o espiritual à matéria e a inversão de valores tomará conta dos Filhos de Deus que se deixarem levar pelo comodismo.

Diego Marcell 04-04-11

Este artigo foi inspirado além dos livros usados como referência, também outros dois que são indispensáveis para a compreensão do tema na atualidade.

Fundamentos da teologia prática de Júlio Zabatiero, editora Mundo Cristão.
A igreja emergente de Dan Kimball, editora Vida.

Referências

HESSELGRAVE, David J. A comunicação transcultural do Evangelho volume 1. São Paulo: Vida Nova, 1994.

L. GONZÁLEZ, Justo. Breve Dicionário de Teologia. São Paulo: Hagnos, 2009.

L. GONZÁLEZ, Justo; Cardoza Orlandi, Carlos. História do movimento missionário. São Paulo: Hagnos, 2008.

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