Para
fazer cinema é fundamentalmente necessário quatro coisas: amor, inteligência,
sensibilidade e sobretudo insolência. (Miguel Torres)
O primeiro filme independente de produção foi Rio, 40 graus (1955) de Nelson Pereira dos Santos, este
filme foi influenciado pelo Neorrealismo, apesar de ser muito anterior ao
‘movimento’ do cinema novo, ele é um
marco inicial neste conceito todo, sendo considerado pelos cinema novistas o primeiro filme brasileiro de fato.
Diferente
dos intelectuais franceses, nós temos uma formação cultural muito confusa:
lê-se primeiro os dadaístas, depois a tragédia grega. (p. 112)
Os três primeiros filmes mais importantes do movimento
são: Vidas secas, Deus e o diabo na
terra do sol e Os fuzis. Foram
feitos longas e curtas antes destes, mas que ainda não refletiam a satisfação
estética dos autores.
Devemos
refletir sobre a violência e não fazer um espetáculo com ela... o interessante
não é a ação em si, mas o seu caráter simbólico. (p. 125 – sobre
a violência usada no cinema, principalmente norte-americano)
Uma grande turma entre cineastas e críticos espalhados
por Rio, São Paulo, Bahia e alguns na Europa mantinham além das primeiras
produções, muitos artigos em jornais e revistas, até que surge a expressão (que
era nova apenas no Brasil) de Cinema Novo. A proposta era se desvencilhar do
colonialismo norte americano, do modo industrial colonial que no Brasil
dominava através dos grandes estúdios (Vera Cruz e Atlântida) com as suas
chanchadas. A ideia do cinema de autor era além de criar argumentos condizentes
a nossa realidade, produzir e também fazer a distribuição, ou seja, colocar
todo o processo na mão do artista, por isso foi criada a Difilm, que era produtora e distribuidora do cinema novo.
No inicio haviam os fortemente influenciados por
Eisenstein como Glauber Rocha, Miguel Borges, Carlos Diegues, David E. Neves,
Mario Carneiro, Leon Hirszman e Marcos Farias; e os que defendiam Bergman,
Fellini e Rossellini que eram Paulo Saraceni e Joaquim Pedro de Andrade. Mas
com o tempo a busca por uma linguagem latino-americana se firmava.
Gustavo Dahl disse que
‘nós não queremos saber de cinema. Queremos ouvir a voz do homem.’ Gustavo
definiu nosso pensamento. Nós não queremos Eisenstein, Rossellini, Bergman,
Fellini, John Ford, ninguém. Nosso cinema é novo não por causa da nossa idade. O
nosso cinema é novo como pode ser o de Alex Viany e o de Humberto Mauro que nos
deu em Ganga Bruta nossa raiz mais forte. Nosso cinema é novo porque o homem
brasileiro é novo e a problemática do Brasil é nova e nossa luz é nova e por
isto nossos filmes nascem diferentes dos cinemas da Europa.
Nossa geração tem
consciência: sabe o que deseja. Queremos fazer filmes antiindustriais; queremos
fazer filmes de autor, quando o
cineasta passa a ser um artista comprometido com os grandes problemas do seu
tempo; queremos filmes de combate na hora do combate e filmes para construir no
Brasil um patriotismo cultural.
Não existe na America
Latina um movimento como o nosso. A técnica é haute couture, é frescura para a
burguesia se divertir. No Brasil, o cinema novo é uma questão de verdade e não
de fotografismo. Para nós a câmera é um olho sobre o mundo, o travelling é um
instrumento de conhecimento, a montagem não é demagogia mas pontuação do nosso
ambicioso discurso sobre a realidade humana e social do Brasil! (p. 52)
Novo não quer dizer
PERFEITO pois o conceito de perfeição foi herdado de culturas colonizadoras que
fixaram um conceito de PERFEIÇÃO segundo os interesses de um IDEAL político. Os
artistas que trabalhavam para os príncipes faziam uma arte HARMÔNICA segundo a
qual a terra era plana e todos os que estivessem do outro lado da fronteira
eram bárbaros. A verdadeira Arte Moderna, aquela que ética - esteticamente
revolucionaria, se opõe, pela linguagem, a uma linguagem dominadora. (p. 133)
Porque a linguagem que
o cinema novo persegue, a linguagem
que dependerá de fatores sociopolítico-econômicos para se comunicar efetivamente com o público e influenciar na sua libertação
não pretende ser a organização de uma academia, no sentido tão prezado pelos
teóricos que necessitam de Deus para se salvar, mas proliferação de estilos pessoais que coloquem em duvida permanente
um conceito de linguagem, superestagio da consciência.
A qualidade da obra de
arte, me disse outro dia na praia o poeta Ferreira Gullar, será resultado da
capacidade que o artista terá de elaborar seu material dentro do maior rigor
dialético: é ele que conjugará informação, imaginação, razão e coragem,
elementos sem os quais qualquer obra de arte não se realiza. (p. 149)
A final o Glauber
queria dizer que o Cinema Novo não era um movimento, mas uma forma de expressão
que não era restrita a nada, como ele escreve em 1965 no famoso texto EZTETYKA
DA FOME:
Onde
houver um cineasta disposto a filmar a verdade e a enfrentar os padrões
hipócritas e policialescos da censura, aí haverá um germe vivo do cinema novo.
Onde houver um cineasta disposto a enfrentar o comercialismo, a exploração, a
pornografia, o tecnicismo, aí haverá um germe do cinema novo. Onde houver um
cineasta, de qualquer idade ou de qualquer procedência, pronto a por seu cinema
e sua profissão a serviço das causas importantes de seu tempo, aí haverá um
germe do cinema novo. A definição é esta e por esta definição o cinema novo se
marginaliza da indústria porque o compromisso do cinema industrial é com a
mentira e com a exploração. (p. 67)
Todo este discurso e esse
legado ideológico continuam validos para os nosso dias, num tempo novo,
precisamos encontrar uma linguagem relevante para o audiovisual brasileiro do
terceiro milênio.
O
cinema novo não é uma escola acabada, é um movimento que se faz, se processa,
se desenvolve à medida que se realiza... precisamos de uma linguagem nova e até
mesmo complexa. A tal simplicidade, as vezes, é apenas um disfarçado recurso da
mediocridade, da pobreza de imaginação, do mau gosto, do primarismo etc. (p.
81)
Nenhum comentário:
Postar um comentário